sexta-feira, 3 de junho de 2011

Uruguai, um passo atrás

unisinos
2/6/2011

A Suprema Corte de Justiça (SCJ) do Uruguai ratificou que as violações dos direitos humanos da última ditadura militar são delitos comuns e não de lesa-humanidade. As violações prescrevem em 1º de novembro próximo. O Executivo estuda como abrir julgamentos nos 88 casos existentes antes dessa data.

A reportagem é do Página/12, 01-06-2011. A tradução é do Cepat.
O pronunciamento do tribunal, instância máxima da justiça uruguaia, atendeu a um pedido de esclarecimento apresentada pela juíza Mirtha Guianze à raíz de uma primeira sentença emitida pela Suprema Corte de Justiça – SCJ que condenou os militares José Cavazzo e Ricardo Arab a 25 anos de prisão como responsáveis por 28 “homicídios muito graves”. Essa sentença descartava a imputação solicitada por Guianze, que havia acusado a Gavazzo e a Arab de delitos de desaparecimento forçado, considerados de lesa-humanidade.

A sentença da Corte explicou que no momento dos fatos, em 1976, não existia o delito de desaparecimento forçado, criado por lei em outubro de 2006, pela qual não se pode imputar esse ilícito. De acordo como esse ditame, os crimes da ditadura (1973-1985) são ilícitos comuns e que perscrevem em 1º de novembro próximo.

A advogada Hebe Martínez Burlé, da família do senador Zelmar Michelini, sequestrado e desaparecido junto com Héctor Gutiérrez Ruiz na Argentina, disse que não concorda com a decisão da Corte: “O Uruguai é signatário de todos os tratados internacionais desde os julgamentos de Nuremberg, incluindo o de São José de Costa Rica, que consideram lesa- humanidade e imprescritível as torturas, o sequestro, o assassinato e os desaparecimentos no marco do terrorismo do Estado”, disse a advogada.

Em sua opinião, “é um grande dilema o que acontecerá após o 1º de novembro porque há muitas ações iniciadas”.

Reconheceu que “é certo que a Corte afirmou uma orientação e será muito difícil continuar com os julgamentos”, mesmo assim, “há casos que poderão continuar sob juízo por jurisdição universal, como no caso dos repressores uruguaios julgados na Espanha”. Martínez Burlé acrescentou que a resolução da Corte tomada pela maioria de quatro dos cinco juízes, “não tem precedentes, porque Nuremberg separou da lei os casos comuns dos casos de terrorismo de Estado e genocídio e graças a ele o povo judeu ainda persegue nazis 50 anos depois do holocausto”.

De sua parte, o senador frenteamplista Alberto Curiel disse que o presidente José Mujica estuda o que fazer com os “julgamentos de 88 casos que mandatários anteriores não levaram à frente”. Afirmou que o Executivo está estudando “a abertura de todos esses casos” juntos, ou “caso por caso”, e o seu “andamento pelo artigo quatro da Lei de Caducidade   [Anistia]”, mas antes de 1º de novembro. O dirigente reconheceu que a decisão coloca o governo numa encruzilhada. “Constitui um grande desafio para a esquerda e para a Frente Ampla – FA”.

A mesma coalizão de centro-esquerda, a Frente Ampla, fracassou na sua tentativa de acabar com a impunidade no Uruguai. Em 19 de maio passado, os deputados frenteamplistas não conseguiram aprovar um projeto que postulava anular a Lei da Caducidade [Anistia]. Esta norma impede que se julguem os militares acusados de violações aos direitos humanos durante a ditadura. Esse frustado texto incorporava a jurisprudência internacional em matéria de crimes lesa-humanidade.

A norma foi aprovada em 1986, durante o primeiro governo após a restauração democrática e ratificada em 1989 e 2009 em plebiscitos, ainda que questionados em sua validade. O governo de Tabaré Vázquez (2005-10) deixou de lado a Lei da Caducidade em alguns casos, o que permitiu prender o ex-ditador Gregorio Alvarez (1981-85) e outros 16 ex-militares e policiais por crimes cometidos durante o regime.

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