terça-feira, 20 de março de 2012

OEA pode levar STF a rever decisão sobre anistia, diz Vanucchi

 

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Uma decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos, culpando o Estado brasileiro pela violação de direitos fundamentais de 62 pessoas desaparecidas durante a ditadura militar pôs em xeque o Supremo Tribunal Federal (STF), que, em abril, rejeitou os pedidos de revisão da Lei da Anistia para punir funcionários públicos envolvidos na tortura e desaparecimento de pessoas acusadas de ligação com a guerrilha contra o regime militar. Para o secretário de Direitos Humanos, Paulo Vanucchi, a decisão da Corte Internacional deve levar à revisão do que foi decidido pelo STF. Ministros do Supremo contestam a interpretação.

A reportagem é de Sergio Leo e publicada pelo jornal Valor, 16-12-2010.

Em nota divulgada ontem à tarde, o ministério de Relações Exteriores informou, sem dar detalhes, que o Brasil "envidará esforços para encontrar meios de cumprir as determinações" da Corte Internacional que não estejam já sendo obedecidas pelo governo brasileiro. Para a Corte Internacional, o país está obrigado, pela Convenção Americana dos Direitos Humanos, da Organização dos Estados Americanos, a investigar e punir os responsáveis pela tortura, morte e ocultação de cadáveres de 62 pessoas desaparecidas durante o combate da ditadura militar à Guerrilha do Araguaia.

O governo, segundo a defesa apresentada à Corte, entende que a Lei de Anistia e a decisão do STF sobre o tema impedem investigações sobre agentes do Estado envolvidos no caso.

A nota do Itamaraty reconhece que o caso julgado pela Corte Internacional, a pedido de organizações não-governamentais de direitos humanos, tratou do "desaparecimento forçado, a tortura e a execução sumária de pessoas" no combate à Guerrilha do Araguaia, entre 1972 e 74. A sentença, além de determinar apuração, julgamento e punição dos responsáveis pelas torturas e mortes, trata de outros aspectos relacionados com os direitos humanos das vítimas e familiares, como a divulgação de informações sobre o caso e indenizações - a maioria dos quais alvo de medidas do governo brasileiro. O Itamaraty cita essas medidas na defesa apresentada à Corte.

Segundo a nota, as medidas, "nos planos legal e político", levaram ao reconhecimento da "responsabilidade do Estado pela morte e pelo desaparecimento de pessoas durante o regime militar; e ao pagamento de indenizações a familiares das vítimas". A nota cita, ainda, o julgamento sobre a Lei da Anistia no Supremo e "os esforços, ainda em curso, de localização e identificação de restos mortais; de compilação, digitalização e difusão de documentos sobre o período do regime militar; e de preservação, divulgação e valorização da memória histórica associada àquele período".

A decisão da Corte, anunciada na terça-feira, coloca o Brasil em situação delicada junto ao órgão de defesa dos direitos humanos da OEA. Na prática, a Corte Internacional julgou que a Lei de Anistia não protege de punição civis e agentes públicos que participaram das violações de direitos humanos, como tortura, assassinatos e desaparecimento durante a ditadura. Já o Supremo não só reafirmou que a Lei de Anistia foi um "pacto social" que fez prescrever a punição a esses crimes como princípios constitucionais impediriam a persecução de agentes públicos. Além disso, no entendimento do Supremo, apresentado como defesa do Brasil na Corte da OEA, a decisão do STF não admitiria recurso, nem a tribunais internacionais.

Esse impasse levou ontem ministros como o próprio presidente do Supremo, Cezar Peluso, e Marco Aurélio Mello a garantir que não haveria mudanças na decisão que garantiu contra punições os responsáveis por violações a direitos humanos durante a ditadura. Para Peluzo, o Supremo mantém o direito de rejeitar qualquer ação contra essas pessoas. Marco Aurélio Mello afirmou que a decisão da corte internacional teria apenas efeito apenas "político", não prático.

Dos sete países da América do Sul com casos em análise na comissão da OEA, entre eles Bolívia e Paraguai, o Brasil foi o único onde não houve julgamento penal dos responsáveis por violações de direitos humanos durante regimes de exceção da década de 70. O Brasil tem, ainda, noventa dias para consultar a corte sobre possíveis divergências de interpretação da sentença e, caso não cumpra alguma das determinações dos juízes, será alvo de relatório, com sugestões de sanções, a ser apresentado pelo tribunal à Assembleia Geral da OEA.

O ministério da Defesa, que coordena os comandos militares, onde estão as maiores reações contra investigação de casos de abuso nos direitos humanos durante a ditadura, informou ontem que não se pronunciaria sobre a decisão da Corte. Os integrantes do gabinete de transição da presidente eleita Dilma Roussef, que terá de decidir sobre os "esforços" de cumprimento da sentença, também preferiram não se manifestar sobre o assunto.

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